Escritora, professora, tradutora e pesquisadora, Graça Graúna, potiguara do Rio Grande do Norte que vive em meio urbano, nasceu em 1948, na cidade de São José do Campestre a 64 km dos parentes da Aldeia Catu. Por volta de dez anos, mudou-se com a mãe costureira, o pai pescador e mais cinco irmãos para Recife, onde reside ainda hoje. Sua produção literária e crítica são referências para a reapropriação das referências culturais ameríndias, buscando uma reterritorialização simbólica¹ de cosmovisões indígenas.
Quando adolescente, Graça Graúna estudou em Natal (RN), no colégio católico de freiras, “Colégio das Neves”, nele, escrevia em um diário que compartilhava seus pensamentos apenas com poucas colegas do internato. Segundo Graça, essas colegas apontaram que ela escrevia “poesia misturada com história” e, desde então, sem esquecer essa observação, ela reconheceu a necessidade que tinha de colocar sua “intuição” no papel.²
Junto a essa vontade de pôr a “intuição” no papel, Graça seguiu escrevendo e seus caminhos a levaram à faculdade de Letras, na Universidade Federal de Pernambuco, onde se graduou, fez mestrado sobre mitos indígenas na literatura infantil e doutorado. Em seu doutoramento, em 2003, Graça defendeu a tese “Literatura Indígena Contemporânea no Brasil”, marco fundamental para a produção crítica acerca da literatura indígena brasileira e que, juntamente ao mestrado, são os primeiros caminhos para uma crítica nacional dessa literatura.
Enquanto produzia sua crítica acadêmica, também escrevia literatura: entre graduação, mestrado e doutorado, produziu e publicou os livros de poesia “Canto Mestizo” (1999) e “Tessituras da Terra” (2001). Atualmente, a produção de Graça inclui poesias, crônicas, infanto-juvenis, traduções e ensaios, tendo publicado ainda o livro de poesias “Tear da palavra” (2007), “Flor da mata”(2014), além do livro “Criaturas de Ñanderu” (2010) e das obras traduzidas em 2013, para editora FTD dos livros de conto indígena da América Latina: “O coelho e a raposa” (povo kiliwa); “O sapo e o deus da chuva” (povo Yaqui); “Baak” (povo maia).³ Além dessas publicações, Graça também integra uma série de coletâneas e antologias literárias no Brasil e no exterior.
Atualmente Graça Graúna é professora adjunta na Universidade de Pernambuco (UPE) e atua principalmente nos temas relacionados à literatura e direitos humanos, literatura e cultura indígena, poesia brasileira. Em 2013 publicou o importante livro “Contrapontos da literatura indígena contemporânea no Brasil” e ainda hoje se dedica aos estudos comparados em literatura, liderando, inclusive, o Grupo de Estudos Comparados: Literatura e Interdisciplinaridade (GRUPEC-UPE). Sua produção cultural também se estende a colaboração em revistas e jornais, entre eles: o Arte e Palavra (Sergipe), Suplemento Literário do Minas (BH) e o Jornal de Letras (Lisboa), em que comenta a literatura da perspectiva indígena.
Em entrevista publicada em seu site, Graça Graúna comenta sobre sua poesia4:
“Quando escrevo, acredito que em minha escrita se manifesta a literatura-assinatura de milhões de povos excluídos na história dos 500 anos. Portanto, posso dizer que há no meu fazer literário traços de literatura engajada. Segue um de meus poemas para ilustrar a questão:
Canción peregrina (*)
I
Yo canto el dolor
desde el exilio
tejendo un collar
de muchas historias
y diferentes etnias
II
Em cada parto
y canción de partida,
a la Madre-Tierra pido refugio
al Hermano-Sol más energia
y a la Luna-Hermana
pido permiso (poético)
a fin de calentar tambores
y tecer un collar
de muchas historias
y diferentes etnias.
III
Las piedras de mi collar
son historia y memória
del flujo del espírito
de montañas y riachos
de lagos y cordilleras
de hermanos y hermanas
en los desiertos de la ciudad
o en el seno de las florestas.
IV
Son las piedras de mi collar
y los colores de mis guias:
amarillo
rojo
branco
y negro
de Norte a Sur
de Este a Oeste
de Ameríndia o Latinoamérica
povos excluidos.
V
Yo tengo un collar
de muchas historias
y diferentes etnias.
Se no lo reconocem, paciência.
Nosotros habemos de continuar
gritando
la angustia acumulada
hace más de 500 años.
VI
Y se nos largaren al viento?
Yo no temeré,
nosotros no temeremos.
Si! Antes del exílio
nuestro Hermano-Viento
conduce nuestras alas
al sagrado circulo
donde el amalgama del saber
de viejos y niños
hace eco en los suenos
de los excluidos.
VII
Yo tengo un collar
de muchas historias
y diferentes etnias.
* poema do livro Tear da Palavra, de Graça Graúna. Belo Horizonte: M.E. Edições Alternativas, 2007, p. 11-12.
1 https://periodicos.ufpel.edu.br/ojs2/index.php/interfaces/article/view/12569
3 https://cidadeverde.com/janelasemrotacao/74757/graca-grauna-poemas