Manaus, julho de 1980.
Santidade João Paulo II,
Eu sou representante da grande tribo Guarani, quando nos primórdios, com o descobrimento dessa grande Pátria, nós éramos uma grande nação e hoje eu não poderia como representante dessa nação, que hoje vive à margem da chamada civilização, Santo Padre, não poderíamos nos calar pela sua visita nesse país.
Como representante, porque não dizer de todas as nações indígenas que habitam este país que está ficando tão pequeno para nós e tão grande para aqueles que nos tomaram esta Pátria.
Somos uma nação subjugada pelos potentes, uma nação espoliada, uma nação que está morrendo aos poucos sem encontrar o caminho, porque aqueles que nos tomaram este chão não têm dado condições para a nossa sobrevivência, Santo Padre.
Nossas terras são invadidas, nossas terras são tomadas, os nossos territórios são diminuídos, não temos mais condições de sobrevivência. Pesamos a Vossa Santidade a nossa miséria, a nossa tristeza pela morte dos nossos líderes assassinados friamente por aqueles que tomam o nosso chão, aquilo que para nós representa a nossa própria vida e a nossa sobrevivência nesse grande Brasil.
Represento aqui o Centro-sul desse grande país, a nação Kaingang que recentemente perdeu o seu líder; foi assassinado Pankaré, no nordeste. Perdeu o seu líder porque quis lutar pela nossa nação. Queriam salvar a nossa nação, trazer a redenção para o nosso povo, mas não encontrou redenção, mas encontrou a morte.Ainda resta uma esperança para nós com a sua vi-sita, Santo Padre, o Senhor poderá levar fora dos nossos territórios, pois nós não temos condições, pois somos subjugados pelos potentes. A nossa voz é embargada por aqueles que se dizem dirigentes desse grande país. Santo Padre, nós depositamos uma grande esperança na sua visita em nosso país, leve o nosso clamor, a nossa voz por outros territórios que não são nossos, mas que o povo, uma população mais humana lute por nós, porque o nosso povo, a nossa nação indígena está desaparecendo no Brasil. Este é o país que nos foi tomado. Dizem que o Brasil foi descoberto, o Brasil não foi descoberto não, Santo Padre, o Brasil foi invadido e tomado dos indígenas do Brasil. Esta é a verdadeira história. Nunca foi contada a verdadeira história do nosso povo, Santo Padre. Eu deixo aqui o meu apelo. Apelo de 200 mil indígenas que habitam, lutam pela sua sobrevivência nesse país tão grande e tão pequeno para nós, Santo Padre. Depositamos no Senhor, como representante da Igreja Católica, chefe da humanidade, que leve a nossa voz para que ainda a nossa esperança encontre repercussões no mundo internacional. Esta é a mensagem que deixo para o Senhor.
Discurso de Marçal de Souza, o Tupã-Y
Fonte:
https://portal.unila.edu.br/editora/livros/e-books/movimento_indigena.pdf