Manaus - Amazonas, 11 de novembro de 1996

Da COIAB para Entidades Internacionais

COIAB – COORDENAÇÃO DAS ORGANIZAÇÕES INDÍGENAS DA AMAZÔNIA BRASILEIRA
“UNIR PARA ORGANIZAR, FORTALECER PARA CONQUISTAR.”

CARTA ABERTA ÀS ENTIDADES DE GENEBRA – SUIÇA

Caros amigos da Europa;

Estou escrevendo esta carta, para justificar o motivo de não participarmos da reunião passada da ONU. Todas as ONG’s estão sabendo que o nosso país, o Brasil, é um campeão em desrespeito às Leis da Constituição Brasileira, onde garante a proteção de cada cidadão brasileiro. Sabem os senhores, que o Brasil, foi o último país, em 1.888 a libertar os escravos, mas isto só está no papel, é também o último país que ainda está matando os índios, como por exemplo, os Yanomami, os Ticuna, os Korubo, os Potiguara, os Deni e outros povos que estão espalhados pelo Brasil inteiro. Senhores, por este motivo, o mundo reuniu-se e disse: “Vamos criar a ONU”, e nada está sendo resolvido para os povos indígenas. A ONU declarou o ano internacional dos povos indígenas em 1993, e neste mesmo ano aconteceu o massacre dos índios Yanomami em Roraima. Diante de tanta promessa para os povos indígenas, e a ganância de ONG’s que só querem se aproveitar das fraquezas dos índios, e também o aumento exagerado de ONG’s falsas, que estão sendo criadas para manobrar recursos destinados para os povos indígenas, somente para fortalecer indivíduos anti-indígenas, saibam os senhores, que o Brasil é o último país que ainda quer contatar os índios isolados sem nenhuma garantia para este povo, protestamos e somos contra porque já vivemos a realidade de contato, mas até agora somente nós, índios, estamos gritando contra isso, cadê as pessoas que estão a favor dos índios? E não é apenas isso que eu citei acima. Onde poderíamos unir as forças e dizer que não estamos parados, pois quando montamos projetos e enviamos aos Governos, só recebemos respostas negativas, que dizem não terem recursos para financiar os nossos projetos, assim sendo, o nosso recurso é limitado, o que nos preocupa muito.
Senhores, na última reunião que eu participei, em julho/96, sobre Direitos Indígenas na ONU, achei muito estranho limitarem 05 minutos para cada expositor, e mais estranho ainda foi o que a senhora DAE falou, que o índio que falasse contra o seu governo seria interrompido com o barulho de um martelo grande. Aqui no Brasil, brigamos muito contra a ditadura militar, abuso contra a mulher, trabalho escravizado e outros atos ilegais. Tudo isso, queremos denunciar ao mundo, porém, só temos 05 minutos para falar, se é para os índios chegarem na ONU elogiando o seu país, não é possível e nem vale a pena gastar recursos para chegar até a Europa.
A nossa vontade é ter tempo para falar e expor os problemas que ocorrem a nível do nosso país, criticando, denunciando e mostrando ao mundo, mas até a ONU nos impossibilita determinando apenas 05 minutos para exposição.
Senhores, se fôssemos à Europa para sentarmos junto com os outros índios e fazermos uma denúncia de modo global, para mostrarmos os fatos concretos e falarmos sobre o que o governo do nosso país está fazendo. seria muito mais importante, e com muita satisfação, gastaríamos os últimos centavos do nosso caixa para realizarmos essa viagem, mas o procedimento da ONU em relação à participação é limitado, e isso nos preocupa muito mais. pois é interessante que nos enviem passagens para irmos até a Europa para ouvirmos o representante do governo falar o que eles estão fazendo com os índios, e ao mesmo tempo termos espaço para reividar, porém o regulamento não nos permite, diante disto “PROTESTAMOS”, porque é muito grave para nós, o tempo de exposição do governo não ser limitado como o nosso.
Se a ONU continuar com esse procedimento controlado pelos governos, sem ouvir os povos indígenas do mundo, aqui protestamos contra esta atitude em nome dos povos indígenas do Brasil.
O que realmente queremos, é que a lei prevaleça como está escrito no papel, e não como a maioria dos ricos querem.
Não adianta preservar a mata sem antes educar o seu povo, não adianta proibir os garimpos sem dar condições de vida aos garimpeiros, não adianta preservar a água sem antes educar os que a bebem, a natureza e o homem estão juntos e não adianta dividi-los para preservar. Esta é uma mensagem para os meus amigos que apoiam a causa indígena de coração.

Certos da atenção que certamente receberemos, despedimo-nos com saudações cordiais.

Darcy Duarth Comapa
 Vice-Coordenador COLAB

Fonte: https://acervo.socioambiental.org/acervo/documentos/carta-aberta-entidades-de-genebra-suica

Original: 1996.11.11 Da COIAB para Entidades Internacionais

 

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