Brasília-DF, 17 de fevereiro de 1993.

Das Lideranças Kayapó para o Presidente Itamar Franco

EXMO, SR. PRESIDENTE DA REPÚBLICA DO BRASIL

ITAMAR FRANCO

 

Nós, lideranças e guerreiros do Povo Indigena Kayapó, que nos encontramos em Brasília, em busca de uma solução definitiva para a questão da sobrevivência do nosso povo, diante das novas| necessidades trazidas pelos brancos, tais como, roupas, ferramentas, combustíveis, remédios para as doenças que nos foram transmitidas, pagamento dos hospitais, etc, dirigimo-nos a Vossa Excelência para expor o seguinte: 

O Órgão do Governo Brasileiro, encarregado de nos dar assistência, a FUNDAÇÃO NACIONAL DO ÍNDIO – FUNAI – por total falta de recursos financeiros há mais de dois anos, não nos tem ajudado em nada.

Diante disso, os próprios caciques e lideranças, tem arcado com as despesas de cada aldeia, para socorrer nossos filhos, nossas mulheres e nossos velhos. 

Como é do conhecimento das autoridades, nós KAYAPÓ, não dispomos de dinheiro, sendo que, tudo que precisamos os brancos nos vendem, ninguém dá nada de graça. 

Para conseguir dinheiro, aprendemos com os próprios brancos, inclusive a FUNAI, há mais de quinze anos, a vender madeira para os madeireiros. 

Queremos lembrar ainda que, em volta das nossas terras, os fazendeiros brancos já desmataram quase tudo, sendo que os brancos sempre venderam madeira. 

Estranhamos agora que, o Governo Federal, através do IBAMA e da Procuradoria Geral da República, bem como, das entidades não governamentais, quiseram nos proibir de vender madeira da nossa terra, deixando nosso povo sem condições de sobreviver. Será que o governo quer que os KAYAPÓ acabem? 

Para evitar conflito ou morte dos nossos parentes, viemos até Brasília para tratar disso com Vossa Excelência, sendo que fomos encaminhados até a FUNAI, onde, após dois dias de reuniões com FUNAI, IBAMA ; Procuradoria, Ministério da Justiça e outras entidades, eles disseram que que não dispõem de recursos para resolverem o problema, mas que, iriam buscar meios de estudar projetos para nosso povo sem precisar derrubar madeira. 

Diante disso, como não podemos ficar morando em Brasília, queremos avisar a Vossa Excelência que estamos retornando ao nosso território onde, como chefes responsáveis pelo nosso povo, continuaremos a trabalhar para conseguir recursos, com o objetivo de compararmos ferramentas, alimentos, roupas, remédios, etc, para não deixarmos nossos parentes morrerem.

Gostaríamos que Vossa Excelência, como chefe maior do Brasil, determinasse aos órgãos do Governo Federal que, em um prazo de três meses, até quinze de maio, elaborem projetos alternativos para nosso povo. 

Até lá, estaremos trabalhando com as madeiras das nossas terras, para que nossos filhos não morram por falta de assistência. 

Confiamos em Vossa Excelência que como Presidente de todos nós, liberem os recursos financeiros necessários para que os índios possam continuar vivendo.

Em maio, se não tivermos resposta, voltaremos a procurar Vossa Excelência. 

 

Assinaturas presentes no documento original. 

 

Fonte: https://acervo.socioambiental.org/acervo/documentos/carta-ao-presidente-da-republica

Original: 1993.02.17 Das Lideranças do povo Kayapó para o Presidente Itamar Franco