São Paulo, 08 de Setembro de 1986

De Alvaro Tukano a Paranapanema e Alto do Rio Negro

SÃO PAULO 08\09\86 

 

A PARANAPANEMA S/A e ALTO RIO NEGRO/86

 

O objetivo desta descrição é para revelar a radiografia politica que incide nas regiões de Pari-Cachoeira e no Rio Içana, principalmente na Serra do Caparo, ambas no município de São Gabriel da Cachoeira – Am

  É impossível detalhar os fatos que acontecem no território indígena do Rio Negro. Esse fato, embora esteja à disposição do governo e das entidades e, mesmo para os índios que são vítimas desta agressão, no mínimo resulta em polemica e nada de solução.

      No caso de Pari-Cachoeira, embora aparentemos como pessoas ruins, temos lutado para conseguir a demarcação de nossa terra. essa luta foi feita durante 16 anos e nos desgastou políticamente, e, inclusive, fomos obrigados matar os garimpeiros (*3 garimpeiros foram mortos no dia 26 de outubro/85, sob comando de Domingos Sávio Brandão, índio Tukano de Pari-Cach.)

Para líderes de Pari-Cachoeira e de Taracuá, a perda de três garimpos, foi insuficiente para analisar o comportamento hostil dos garimpeiros, porque só se conseguiu intrigas e afastamento dos órgãos governamentais.

Os índios de Pari-Cachoeira conseguiram tirar da área mais de 1.000 garimpeiros, e em janeiro do ano em curso fizeram 35 reféns, na serra do Tiaúa sob comando de Pedro Fernandes Machado, índio Tukano da vila de Pari-Cachoeira .

Devido a circunstância difícil, em novembro do ano passado fomos obrigados esquecer os problemas internos/políticos na região e passamos p/ correr em Manaus e em Brasília.

Depois de termos feito contato com as autoridades de Brasilia, em dezembro/85, não conseguimos nada de concreto para interesses de Pari-Cachoeira, que era a demarcação da terra.

O custo empregado pelas lideranças de Pari-Cachoeira, de outubro/85 a março/86, foi suficiente para analisar o quadro financeiro da FUNAI e das entidades. O custo do Sr. Benedito Fernandes Machado, índio e líder geral de Pari-Cachoeira, do Sr. Enídio Fiado, Tuiuka, Líder adjunto na serra do Troirá, foi graças à cooperação dos próprios indígenas.

Nesse período, a grande colaboração das entidade foi na orientação como chegar na CNBB, no MILAD e nada mais.

A nossa maior dificuldade foi para conversar com Presidente da FUNAI  – Apoema Meireles com cel Luis Guadalupe, chefe da ASI – na FUNAI, com ministro Ronaldo Costa Couto e mesmo com alguns funcionários da FUNAI , e mais a perseguicão e campanha que sofremos por parte do Sebastião Amâncio da Silva – Delegado da 1ª  DRMAO, e do Ten. José Alves, chefe do DAI, em Brasília.

Foi esse período mais difícil de todos os tempos. Pari-Cachoeira reconhece a bondade da prof*a Aleida Ramos, da UNB, porque lá conseguimos pousar e passar as noites. Também reconhecemos o CIMI – BSB, CPI_SP; CED e mais outros amigos que viram a nossa situação.

Devido impasse político criado pela FUNAI, conseguimos levar alguns índios funcionários da FUNAI para Pari-Cachoeira. Eis os nomes:

  1. Carlos Estevão Taukane – BAKAIRI.
  2. Carlos Marcus – TERENA. 
  3. Olair – KARAJÁ.
  4.  Idjiahuri – LARAJÁ.
  5. Kurejete – KARAJÁ.

     Estes funcionários que estavam à serviço da FUNAI foram presos em Presos em Pari-Cachoeira, mas de modo diplomático, isto é, não foram agredidos. Liberamos três (Carlos, Marcus Olair Idijiahuri) para fazer contato com BSB em São Gabriel da Cachoeira.

No dia 30 e 31/1/86 foram presos as seguintes pessoas:

1°) Cel. Luís Guadalupe – chefe da ASI, por representar a FUNAI oficialmente e por estar vestido uma camiseta com simbolo do governo Gilberto Mestrinho; 

2°) Prof°  Sebastião Amâncio da Costa, Delegada da FUNAI , MAO.

Outros brancos que ali chegaram não foram presos, mas presenciaram a reação do povo contra a falta de responsabilidade da FUNAI. Se fossemos matar eram só esses dois, isto é, nada tinhamos a ver com outros companheiros. 

Na noite de 30/86, nós, as lideranças indígenas sofremos a pressão de nossos companheiros, porque de nossos companheiros, porque estes querião as cabeças que foram mencionados, mas achamos melhor entrar numa negociação e, por isso, estes vivem até hoje, isto é, graças a mim e outros líderes.

Em abril do corrente ano nos reunimos em Manaus com Sr. Presidente da FUNAI  – Apoema Meireles e foi lá que tomamos conhecimento sobre o projeto Cacha Norte do Sr. Gal Rubem Bayma Denys, Secretário Geral do Conselho de Segurança Nacional e acessor do Sr. Presidente da República, Sr. José Sarney.

Não tendo mais apoio por parte das entidades e da própria FUNAI viemos com uma delegação maior.

1°) Presidente da UCIRT – Lúcio Miguel Fonte – TUKANO

2°) Ovidio Cunha Marinho – Vice – TUKANO

3°) Carlos Eugênio Fernandes Machado – Secretário – TUKANO 

4°) Benedito Fernandes Machado – líder 

5°) Pedro Fernandes Machado, líder

6°) Carlos Antonio Fernandes Machado, líder

7°) Henrrique Castro, cacique de Pari-Cachoeira

8°) Álvaro Fernandes Soui porio – Acessor e procurador da UCIRT.

Para movimento indiígena de Pari-Cachoeira foi importante porque no dia 31/01/86 as lideranças me deram o bastão de chefe e nomearam como pessoa de confiança para negociar com os homens do governo. Assim, no dia 1° de março vim para Manaus para responder em nome do povo de Pari-Cachoeira. Nesse avião vieram as duas entidades da FUNAI que quase morreram e passaram a me respeitar como líder de Pari-Cachoeira. 

Toda tramitação burocrática foi atrapalhada, porque houve mudança de ministro, a troca de presidente. Nessa época fomos mais firmes para falar com as autoridades da FUNAI.

Para começar, a FUNAI hospedou os líderes numa pensão feia, cheia de mosquitos e inseguro devido a concetração de muito garimpeiros em Manaus. Os nossos líderes. Os nossos Líderes começaram a andar com armas de fogo para andar na cidade, isto é, era jeito usar os Taxis e gastar dinheiro que pouco tinhamos.

Eu não fiquei no hotel e sim na casa de minha tia. Mas os nossos companheiros descobriram que a fora a Paranapanema custeando as despesas do hotel, e, isto irritou os índios e foi preciso descer cacete na FUNAI e na Paranapanema S/A.

  E, como não tinhamos dinheiro e, porque aceitávamos a interferência da FUNAI, algumas de nossas lideranças começaram enfrentar a Paranapanema, o Gilberto Mestrinho e com e com próprio José Altino Machado, no aeroporto internacional.

Com excessão a mim, a diretoria da UCIRT teve uma reunião clube da Paranapoema e no escritório da Taboca, quando, eutóro, se encontraram com Dr. Octávio Lacombe – Conhecido como “Tarzani”  no meio dos empresários.

Me parece que foi suficiente para traçar um plano para chegar em BSB e falar com as autoridades da FUNAI, do CSN, MINTER, DNpm e Ministério das Minas e Energia.

Nesse período conseguimos as seguintes autoridades. 

1o) Dr. Octavio Lacombe 

Diretor executivo e Presidente do Grupo Paranaponema S/A.

2o) Dr. Engenheiro Nelson Dorneles 

Acessor especial do Lacombe, 

Cel do Exército, amigo do Gal Otávio Aguiar de Medeiros, amigo do Cel Fregapani, responsável  pelo CS Nacional, ambos do CMA. 

A função do Cel Dorneles era para encontrar uma maneira de não brigar com os índios. Isso era chamado como uma “boa vizinhança”.

Foi o Cel Dorneles que conseguiu levar a direção da UCIRT para fitinga, e outros contatos com governador Gilberto Mestrinho. O Cel Dornelles pertencia à mineração Torboca, e por ser mais hábil foi escolhido para projetos da serra do Traíra e Serra do Corporo, no Rio Içema.

3o) Tem Tadeu, um dos membros do grupo Paranapanema, hoje, dono da Sacopã. Tem outro, também, com o  mesmo nome que é o filho do primeiro. Este é do exército e arranja revolvéres para índios mais chegados.

A operação feita na serra do Traíra foi graças a este tenente, e hoje existe capitão da PM, que não me lembro do nome que opera no Rio Içama.

4o) Dr. Hitler Nautes, Acessor especial para assuntos do Planalto – DF.

Durante esse período percebemos o peso de nossa responsabilidade e buscamos uma maneira de sair da tutela da FUNAI. Então, a UCIRT ficou num hotel chamado Solimões, no centro da cidade, onde as diárias não eram baixas. As despesas do hotel, passagem e alimentação foram em base do entendimento, isto é, que seria pago futuramente com a exploração do ouro e outros materiais, na Serra do Traíra. Foi assim que viemos para Manaus, Brasília e Sáo Paulo onde nos deparamos com as autoridades.

Hoje, depois de muito quebrarmos as nossas cabeças, conseguimos acompanhar o mundo dos brancos e decidimos levar as autoridades em Pari-Cachoeira.

O objetivo do nosso convite foi para chamar atenção do público, demonstrando o nosso lado político e pacífico de nossa direção, e, indiretamente demonstrar a nossa capacidade e exigir a demarcação das terras indígenas na faixa de fronteira. Para isso foi necessário repudiar o Projeto Calha Norte que era.

Esse projeto caia em cima do Alto Rio Negro e Roraima.

O Gal  Baymar Dennys dava:

1o) 1 caminhão Mercedes Benz

2o) 1 trator agrícola

3o) três moto-serras

4o) 1 geladeira à querosene

5o) 1 barco (motor e barco madeira)

6o) materiais para agriculturas.

Esse projeto foi apoiado pelo Ministro do Interior, e pelo presidente da FUNAI e pelo Superintendente da FUNAI, em Manaus, porque era a única maneira de conjugar as forças para controlar o movimento indígena.

Numa visita que fizemos ao Palácio do Rio Negro, no final do encontro, a UCIRT pediu alguns dos materiais mencionados.

No final da estória é que o Gal Rubem Baymar Dennys está custeando a candidatura do Amazonino Mendes, o candidato do Gilberto Mestrinho. O Gal dá materiais e dinheiro para calar a boca das comunidades indígenas menos organizadas nas faixas de fronteira. Esses materiais dão para comprar os votos dos índios para Amazonino. Aqui se encerra como está o projeto Calha Norte. E, além disso, os Paranapoema S/A custear o mesmo candidato que defenderá aos interesses dos poderosos mineradores.

A Pari-Cachoeira não escapa desse jogo. Lá o pessoal quer a demarcação da terra, e não aceita a colonização. Fala-se de que já temos uma reserva, isto é, o nosso povo conhece e defende os limites da reserva.

O nosso povo, com mais experiência na organização e na luta, defende a política mineral. Por isso, no dia 16 de agosto foi feito o acordo de cavalheirismo, o acordo de convivência e foi demonstrado as autoridades os limites de nossas fronteiras. Não houve nenhum acordo formal  para pesquisa e exploração na Serra do Traíra. 

Existe o plano interno que o seguinte: A Serra do Traíra foi aberta para todos os filhos dos Índios da região, porque só assim é que a Pari-Cachoeira podia ajudar outros irmãos a tomarem consciência e causa para lutar juntos.

É o plano da UCIRT que, enquanto não houver a demarcação da terra, não haverá nenhum acordo. As pesquisas terminam daqui a dois anos, isto é, temos dois anos para organizar o nosso povo e decidir, em conjunto, para demarcação da terra contínua no Alto Rio Negro. Em Pari é assim.

 

Serra do Caparo – Rio Içama

 

No Rio Içama acontece tudo contrário. A FUNAI acessava os índios fazendo projetos. Assim no dia 14/07/86, em Tucuruí foi firmado um acordo entre FUNAI (índios) e Paranapoema S/A para obter um transito livre. Em teoria a empresa deu aos Índios, cantina, barco, uma coisa que não posso confirmar.

Está havendo um forte esquema de segurança da SAEDÃ, e ultimamente até os próprios índios foram expulsos. A segurança, ainda, tem apoio do exército. E lá vai a estória.

 

AFSu

 

Fonte: https://acervo.socioambiental.org/acervo/documentos/carta-paranapanema

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