Aldeia Hespõhurê - Tocantins, 16 de junho de 1994

Da Associação Indígena Xerente (AIX) para o procurador da República

Excelentíssimo Senhor Procurador da República
Palmas – Estado do Tocantins:

Nós indígenas Xerente, habitantes na Reserva Indígena Xerente, tomamos conhecimento através do indígena Ranulfo Cursino de Oliveira Xerente, morador fora da Reserva, no limite com o Rio Gorgulho, que um grupo de japoneses acompanhado de técnicos do Governo do Estudo do Tocantins, estão pretendendo construir uma barragem no local conhecido “Cachoeira do Rio Gorgulho”, região confrontante entre a Área Indígena Xerente e o Município de Pedro Afonso. Segundo informações de Ranulfo Cusino O. Xerente, dia 26 de maio de 94, compareceram em sua propriedade – local da cachoeira – 8 pessoas: 4 eram japoneses e falavam Português, 3 eram estrangeiros europeus e não falavam o Português; os 7 estavam acompanhados do Sr. Tiãozinho, dono de grandes fazendas no município de Pedro Afonso e também conhecido por todos como o dono da Empresa de Laticínios VIGOR. O grupo instalou aparelho para medir a velocidade da água nas 3 quedas da cachoeira e com nivelador fez medidas de nível, chegando a indicar o local que seria construida a barragem. Mostraram interesse em comprar a propriedade de Ranulfo de 100 hectares. Indagado se o grupo já havia mantido contato com os índios Xerente, eles responderam que não era necessário e que tudo já estava resolvido e que a verba já estava liberada e que o projeto era muito importante para levar energia elétrica para Pedro Afonso e fornecimento de água para projeto de irrigação de soja, milho, arroz, plantio de eucalipto e fava danta para aproveitamento medicinal. Ranulfo por não saber ler, só conseguiu identificar o emblema do Governo do Estado do Tocantins (duas mãos dadas). Assim que essa notícia correu nas aldeias, as lideranças Xerente estão revoltadas. Nós pensamos como que os homens brancos tentam invadir nossa reserva sem nos consultar e sempre vem nos tratando como que não fóssemos donos de nossas terras.

Senhor Procurador, nós Xerente não aceitamos essa barragem no limite de nossa reserva; porque grande parte de nossas terras serão inundadas, como nos locais Barreiro, Brejo do Sítio, Lajeiro, Água Boa e Taboca além de outras partes serão inundadas, dentro de nossas terras. Senhor procurador pedimos providências para que nos possamos viver em paz em nossa terra que já não é grande como no passado e mais uma vez estamos sendo pressionados pelo Governo do Estado do Tocantins. Basta a pressão e a dor de cabeça que já temos com a intenção de construir asfalto e a ponte do Rio Sono dentro de nossa terra. Em reunião na Casa da A.I.X. decidimos não aceitar nenhum tipo de invasão que venha prejudicar nossa comunidade, queremos viver em paz. Temos a suspeita que essa construção de barragem deve ser verba do PRODECER (Projeto de Desenvolvimento do Cerrado) financiamento de capital japonês em convênio com o Governo do Estado do Tocantins. Aguardando providências dessa honrada instituição, subscrevemos esta:

Assinam abaixo.

Fonte: https://acervo.socioambiental.org/acervo/documentos/carta-ao-procurador-da-republica

Original: 1994.06.16 Da Associação Indígena Xerente (AIX) para o procurador da República

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