Das lideranças indígenas para Ministro da Justiça

Manaus-AM, 06 de janeiro de 2005.

Ao Ilustríssimo Senhor Ministro da Justiça 

Dr. Marcio Thomas Basto

Estimado Senhor,

 

Nós, lideranças Indígenas abaixo assinados, apoiados pelos povos indígenas: Kokama, Dessano, Apurinã, Baniwa, Tariano, Piratapuá, Tikuna,  Tukano, Marubo, Sateré, Mura, Macuxi, Kambeba, Macuxi, Munduruku e pelas organizações:  Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira – COIAB;  Associação das Mulheres Indígenas do Alto Rio Negro – AMARN; Conselho Indígena Mura – CIM; Organizações dos Povos Indígenas Mura Tauaris – OPIMT; Organização dos Povos Indígenas do Médio Purus – OPIMP; Associação Wocthimaucü – ACW; Organização das Mulheres Indígenas do rio Urubu – OMIMRU; Associação  Indígena de Barcelos – ASIBA; União das Nações Indígenas de Tefé – UNI/TEFÉ; União dos povos Indigenas Mura e Saterê Mawé – UMPIMS; Conselho Indigena do Vale do Javari – CIVAJA; Conselho Geral da Tribo Ticuna – CGTT; Conselho Geral da Tribo Saterê mawé – CGTSM; Poterikharã- Numiá – Associação das Mulheres Indígenas; MEIAM- Movimento dos estudantes Indígenas do Amazomas; UPIMS-União dos Povos Indígenas Munduruku e Saterê Mawé.Informamos que na tarde do dia 03 de janeiro de 2005, ocupamos a sede da administração da Fundação Nacional do Índio – FUNAI de Manaus – AM, de forma pacifica. A ocupação, Sr. Ministro, se deu pelas seguintes razões:

 

  1. O Administrador Regional da FUNAI em Manaus, Benedito Rangel de Morais, tem cometido varias irregularidade contrárias a sua função, contrariando os Direitos indígenas garantidos na Constituição Federal e contrariando normas administrativas como:  a) – Patrocínio de farras e bebedeiras no município de Autazes, com recursos da FUNAI; b) – Utilização de carros oficiais para atividades particulares, como a utilização nos supermercados; c) –  A não transparências nos gastos com recursos destinados às comunidades; d) – A não resolução de casos de Assédio sexual praticados por servidores da FUNAI nas comunidades indígenas; e) – A não contemplação de estudantes indígenas qualificados no quadro de estagiários da FUNAI; f) – Favorecimento de cargos e de benefícios para seus parentes e amigos em nome dos indígenas; g) – Omissão de funcionários que só trabalham mediante pagamento as diárias; h) Aliciamento e captação do administrador às lideranças indígenas mura; 

 

  1. Numerosas terras indígenas, da área de administração da Regional/Manaus, não foram até agora demarcadas, conforme determina a Constituição Federal; 

 

  1. O governo federal não cumpriu até agora com as promessas feitas em sua campanha presidencial, particularmente no sentido de instituir uma nova política indigenista com o objetivo de atender os reais e prioritários interesses do povo indígena;

 

Na tarde da ocupação, os indígenas adentraram o prédio da FUNAI em um grupo de 32 índios da etnia Mura que exigiram a saída imediata dos funcionários do referido órgão, dessa forma, ocupando a sede. 

No momento da ocupação o Sr. Bendito Rangel de Morais e outros funcionários, refugiaram-se em seu gabinete, com firmeza de sairiam da sala somente com a presença da Polícia Federal.

Com a chegada da PF no dia 03 de janeiro, o Sr. Benedito Rangel, juntamente com o Sr.  Jorge Fernandes, e o Delegado Sérgio Fontes, iniciaram as negociações comprometendo aos ocupantes a sala com telefone/fax, que ficaria a disposição. Mas que no dia seguinte voltariam a sede do referido órgão para uma negociação, mas por ocasião de uma agressão ainda no momento da ocupação, contra o Cacique da etnia Mura Antonio Batista Mota feito pelo Sr. Jorge Fernando Administrador Substituto, os indígenas ficaram revoltados. 

Alem disso, não deixou a sala como acordado, os indígenas mudaram seu acordo feito entre o administrador e os indígenas ocupantes e que só aceitariam as negociações com presidente do órgão de Brasília. Pois    As salas ficaram trancadas, sem água e sem telefone. Em conseqüência disso, decidiram a não renegociação.

No dia 04/01/05, as 10:15, o referido Sr. Administrador, chegou na sede desta administração, acompanhado por uma equipe de policiais federais, pedindo para entrar no portão. Foi o momento em que as lideranças indígenas mura, não deixaram ninguém entrar. Estabeleceu-se um momento de tensão, onde o coordenador geral da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira – COIAB, Sr. Gecinaldo Cabral da Tribo Sateré-Mawé, foi tentar acalmar o administrador que se alterava contra as lideranças, questionando a legitimidade das reivindicações. 

Também foi o momento em que o delegado da policia federal, Sergio Fontes, perdeu o controle e instigou o coordenador geral a uma briga, dizendo ao mesmo, “vem para porrada” ao mesmo tempo dando a ordem de prisão. Nesse momento, um de seus policiais federais, empunhou uma arma engatilhando na direção dos indígenas que estavam no pátio do prédio da FUNAI e, ao  perceber a presença da imprensa no local, se retirou e foi se esconder no carro, suficiente para revoltar mais ainda os manifestantes.

Diante desse caso, as lideranças indígenas levaram o fato ao conhecimento da Procuradoria Geral do Estado, através de um abaixo assinado que também foi enviado ao Presidente da Fundação Nacional do Índio – FUNAI, na tentativa de estabelecer um diálogo. Onde obtivemos apenas uma conversa por telefone, com seu vice-presidente, Roberto Lustosa que sugeriu a desocupação da sede e, em breve iniciar uma negociação, onde afirmou ainda, “se for preciso vou ai”. Pediu que fosse providenciado outro documento, e que as reivindicações da carta estavam muito “pesadas, que não seria bom para o órgão indigenista”, segundo ele. Perguntou ao senhor Gecinaldo se queria pleitear alguma função. Em reposta ao Roberto Lustosa, Sr. Gecinaldo Cabral, disse a ele, que a manifestação era das lideranças das aldeias, portanto a COIAB, estava apenas acompanhando o caso, por ser uma organização representativa dos povos indígenas da Amazônia Brasileira. 

Em seguida, buscamos articular com a Coordenação Geral do Departamento de Índios Isolados CGDII, onde fizemos contato com Sr. Sidney Possuelo, Coordenador, de quem pedimos apoio encaminhar o abaixo assinado. No dia 06/01/06, as 8:00 da manha horário local, falamos por telefone com Dr. Mércio Pereira Gomes, onde perguntamos a ele, se iria negociar com as lideranças indígenas ocupantes da sede da FUNAI, ele nos respondeu, “eu nunca fui numa invasão e nunca irei, e muito menos vou negociar. O que os índios tem de fazer é desocupar a sede da FUNAI. Do jeito que o órgão está, e com essa ocupação, ficará pior e já fiz o pedido de reintegração de posse ontem”, após sua fala desligou o telefone. O que nos deixou muito preocupado por se tratar das questões indígenas com o órgão oficial indigenista brasileiro. 

Após ouvir o posicionamento do Sr Mércio Gomes, as lideranças presentes iniciaram uma intensa articulação, com as organizações aliadas, e segmentos sociais, nacionais e internacionais, onde tivemos apoio local, como: do Deputado Estadual, advogados, que canalizou caminhos que facilitasse uma negociação diretamente com Vossa Excelência, na tentativa de solucionar os descasos cometidos pelo órgão oficial indigenista, contra as lideranças nas reivindicações dos seus direitos constitucionais.

Vale ressaltar que a reivindicação das lideranças não é de interesse pessoal, mas em vista de verem suas terras invadidas, saqueadas, sem mínima defesa e a ausência do órgão nestas comunidades mais longínquas da Amazônia brasileira, onde estão sem defesa e vivendo na mercê da sorte. Mencionamos ainda que essa situação são graves, que as comunidades e povos indígenas precisam de uma atenção de fato com qualidade. Não estamos aqui fazendo qualquer tipo de ato ilegal, é uma forma de apresentar as nossas autoridades de quem podemos pedir apoio e viver em paz em nosso território.

Portanto Sr. Ministro, vimos pedir em nome dos povos indígenas da Amazônia brasileira, uma intervenção de Vossa Excelência, na reintegração de posse pedido do Sr. Presidente Mércio Gomes ao juiz, e abrir um diálogo imediato para nossa negociação, no sentido de evitar situações desagradáveis com as populações indígenas. Haja vista que vivemos no país democrático.

Pois estamos fazendo a ocupação, pacificas, sem violência, sem destruição, o que exigimos é nosso direito perante o órgão. Caso venha acontecer à reintegração de posse, poderão acontecer fatos piores o que não seria uma boa imagem para o povo brasileiro.

Portanto pedimos que seja visto com muita atenção, no aguardo da resposta de V. Exa., e com maior brevidade, subscrevemo-nos.

 

Atenciosamente,

Nós abaixo assinamos:

Fonte: www.coiab.org.br

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