São Paulo, 3 de novembro de 1981
Prezados amigos líderes indígenas,
É com prazer que lhes dirijo esta carta porque creio que vou descobrir muitos irmãos que lutam pela demarcação de suas terras junto a FUNAI. A terra é nossa e não podemos compra-la e nem vendê-la para outros que não conhecem o valor que ela tem para nós. Porque quem tem a sua terra e o povo dentro dela pode dizer que tem a AUTODETERMINAÇÃO, e sentir-se livre do outro. Muitas vezes, chegam em nossas terras gente estranha e querem mandar mais que os verdadeiros donos da terra; e outras vezes, até ameaçam devorar tudo o que temos de bom. Assim notamos, que, nós, não temos união, e por isso, obedecemos aos outros.
Muitos de vocês sabem o que aconteceu em São paulo, entre os dias 26 e 30 de abril, quando houve a escolha de nova diretoria da União das Nações Indígenas do Brasil, e assim ficou a diretoria:
Presidente: Marcos Terena, Mato Grosso do Sul.
Vice-presidente: Álvaro Fernandes Sampaio,
Tukano, Amazonas.
Secretário: Lino Pereira Cordeiro, Miranha,
Amazonas.
Assumimos a grande responsabilidade diante daqueles que nos elegeram. O Sr. Domingos Marcos Veríssimo ao deixar a presidência provisória da União das Nações Indígenas garantiu-nos que estava muito contente e nos desejou muita coragem na luta. Os pronunciamentos dele foram gravados e o mesmo teve entrevista com a imprensa, afirmando mais uma vez que cumprira a sua tarefa.
A nova diretoria até agora não tinha conversado ou escrito uma carta diretamente a vocês porque foi assim o contrato que fizemos em Aquidauana, Mato Grosso do Sul. Mas agora o fazemos para convidar a um trabalho em conjunto, porque percebemos que, somente assim, poderemos ter a nossa AUTODETERMINAÇÃO. O objetivo desta carta é despertar alguns líderes indígenas das malocas, das aldeias maiores, das comunidades, para que os chefes, em geral, de cada tribo, assumam sua responsabilidade no devido lugar para cuidar de seu povo. Nosso objetivo é: unir todos os índios para preservar suas terras porque elas são o mais importante para a Paz e a Vida dos nossos filhos. É nelas que está toda a nossa história, a coragem dos nossos antepassados e o futuro do nosso povo. Podemos ter a garantia dela somente através da demarcação. Para trabalhar e comer bem, e para não ficar trabalhando para outros, e para sentir-se livre de qualquer ordem que não nos agrade é preciso ter a terra garantida.
Portanto, senhores líderes ou chefes, a União das Nações Indígenas deve ser do conhecimento e voz de todos nós; para isso a sua diretoria precisa de vocês para ter muita força na luta. Os líderes não devem se confundir na luta, como fazem os brancos quando disputam as eleições.Outra notícia: os líderes dos povos indígenas do Equador, Colômbia, Peru, Bolívia, Brasil e Venezuela terão um momento em Caracas em julho do próximo ano, para tratar dos assuntos comuns: Problemas de terra, autodesenvolvimento, educação. Estarão também antropólogos e entidades de apoio à causa indígena e os representantes dos governos com os quais teremos diálogo como representantes de povos indígenas. Esperamos ter uma coisa concreta em referência à União das Nações Indígenas.
Confiantes de que comprenderão a mensagem, esperamos suas cartas com notícias e sugestões, para que possamos ter uma ação unitária e realmente representativa.
Álvaro Fernandes Sampaio
Original: 1981.11.03 De Álvaro Tukano para Lideranças Indígenas