MANAUS (AM), 20 de junho de 1986. 

Da Comunidade Indígena de Pari-Cachoeira para a FUNAI

Ao 

Exmo Sr. 

SEBASTIÃO AMÂNCIO DA COSTA 

DD Superintendente da FUNAI – MANAUS /Am. 

 

Senhor Superintendente,  

Informamos a V.Excia que, a Comunidade Indígena de Pari-Cachoeira, reuniu-se em Assembléia Geral e Extraordinária nos dias 8 e 9 do mês em curso, entre vários assuntos foi destacado o problema da demarcação de terra; faixa de 150 km na área de fronteira, proposta de criação de Colônia Indígena de Pari-Cachoeira.  

Informamos a V.Excia que no dia 04 do mês corrente, em Brasilia-DF, nós, Índios, líderes e representantes de nossa sociedade, reunimo-nos com o Ministro do Interior, Dr. Ronaldo Costa Couto; General Baema Denys, Ministro Chefe do Gabinete Militar e Secretário Geral do Conselho de Segurança Nacional Dr Romero Jucá Filho, Presidente da FUNAI, Dr. Gerson da Silva Alves, acessor do Ministro e ex-presidente da FUNAI; Deputado Federal Mário Juruna, onde foi discutido a demarcação da terra indígena de Pari-Cachoeira, quando então, os dois Ministros de Estado informaram-nos que era impossível a criação de reserva indígena, porque Pari- Cachoeira situava-se na área de fronteira, portanto na área de Segurança Nacional e como solução só seria a criação de Colônia Indígena, onde cada família adquiria lote com seu respectivo título de propriedade. 

Essa proposta de criação de Colônia Indígena de Pari-Cachoeira, foi levada por nós, junto à Sociedade Indígena de Pari-Cachoeira, cuja, foi rejeitada por unanimidade pela nossa comunidade. 

A rejeição do Povo de Pari-Cachoeira & criação de Colônia Indígena foi, porque os Índios entendem que com divisão da terra em lotes, somente as famílias privilegiadas, as famílias tradicionais seriam beneficiadas, porque a própria história nossa, apoia, não importando o tamanho que caberia a cada uma dessas famílias e, com isso, as famílias de classe inferior, as não privilegiadas, e/ou que vieram de outras regiões indígenas, isto é, as infiltradas, ficariam sem terra na condição de serviçal ou empregado do empregado, isso, provocaria conflitos de ordem social, violência e nossa autodestruição.

Entende a sociedade indígena de Pari – Cachoeira, que Colônia Indígena, mesmo que as famílias privilegiadas e tradicionais não usassem de má fé com o restante da comunidade, tinha elementos que conheciam cidades e forma de conseguir amparo legal, e desse jeito a maior parte da sociedade ficaria prejudicada.  

Tendo colocado em debate o lado positivo e negativo da Colônia Indígena, a Sociedade Indígena de Pari-Cachoeira acredita que a solução dos conflitos diversos e a DEMARCAÇÃO DA TERRA CONTÍNUA ou RESERVA INDÍGENA CONTÍNUA; porque não atrofiará a sua liberdade de trabalho, de ação, de progresso como homem, pessoa, humano, enfim, a sua autodeterminação.  

A DEMARCAÇÃO DA RESERVA INDÍGENA CONTÍNUA DE TERRA da área de Pari-Cachoeira defendida pela comunidade indígena em virtude de setor de conflitos e dificuldades e no lado oeste, na região da Serra do Traíra, informa que, seu direito se estende à foz do rio Ira, subindo, até chegar abaixo da Cachoeira do Ira na margem direita, entrando pelo afluente conhecido por Pedra Branca, subindo, até chegar na Vereda Milenar ou Caminho Imemorial, a margem direita, que percorre no sentido oeste, chegando às cabeceiras do rio Abiú, descendo, até o rio Castanho que desemboca no rio Traíra e subindo por este, seguindo a linha da divisa de fronteira Brasil/Colômbia no sentido noroeste, até chegar a cabeceira do rio Tiquiê, descendo por este pela margem esquerda, ficam como limites, as nascentes de seus afluentes até confrontar-se com a foz do rio Ira. 

Acredita a Sociedade Indígena de Pari-Cachoeira que já vive e sempre viveu dentro da área demarcada, só que a sua educação sempre orientou no sentido de acreditar e respeitar nas autoridades constituídas, e é o que tem feito até agora e continuará fazendo, jamais procurou pedidos e atitudes conflitantes a quem quer que seja, muito menos ao governo. 

Por isso, entende o povo de Pari-Cachoeira, que não está pedindo terra de NINGUÉM e a NINGUÉM, só está pedindo apoio moral e legal do governo, isso nunca transformou nenhum ser humano num criminoso. 

Esperando que a V.Excia compreenda e respeite a posição do nosso povo, solicitamos soluções justas e providências legais para os problemas que afligem a Comunidade Indígena de Pari-Cachoeira, e na oportunidade reiteramos nosso protesto de elevada estima e respeito. 

 

LÚCIO MIGUEL FONTES – Tukano 

Presidente da Comunidade Indígena de PARI – CACHOEIRA / AM.  

BENEDITO FERNANDES MACHADO – Tukano

Líder Geral e Porta-Voz 

HIGINO PIMENTEL TENÓRIO – Tuyuca 

Líder Adjunto 

ÁLVARO FERNANDES SAMPAIO – Tukano 

Líder e Procurador 

 

Fonte: https://acervo.socioambiental.org/acervo/documentos/carta-ao-superintendente-da-funai

Original: 1986.06.20 Da Comunidade Indígena de Pari-Cachoeira para a FUNAI

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