Da União das Nações Indígenas de Tefé para o Brasil.

Aldeia Nova Esperança, TI Barreira da Missão, Município de Tefé – AM, 05 de junho de 2006.

 

            Nós, lideranças de 27 Aldeias Indígenas (Tupã Supé, Igarapé Grande, Jaquiri, Porto Praia, Vila Nova II, São José, São Pedro, Boarazinho, Boa Vista, Santa Fé, Bugaio, Bacabal, Espírito Santo, Arauacá, Acapuri de Cima, Nova Esperança, Barreira da Missão do Meio, Betel, Barreira da Missão de Cima, Boca do Biá, Nossa Senhora de Fátima, Itaúba, Morada Nova, Miratu, Patauá, São Francisco e Méria); de19 Terras Indígenas (Tupã Supé, Igarapé Grande, Jaquiri, Porto Praia, Cuiu Cuiu, Boará, Estrela da Paz, Macarrão, Espírito Santo, Arauacá, Acapuri de Cima, Barreira da Missão, Biá, Nossa Senhora de Fátima, Deni, Miratu, Paraná do Paricá, Urubaxi e Méria); de 07 Povos Indígenas (Tikuna, Kambeba, Miranha, Kokama, Katukina, Deni e Kanamari) presentes em 06 municípios (Tefé, Alvarães, Maraã, Uarini, Jutaí e Itamarati) e representantes de 16 organizações indígenas, da sociedade civil organizada e instituições governamentais (UNI, CIJA, COPIJU, ACPIMSA, Prelazia de Coari, GPD, OPAN, IDSM, CIMI/Prelazia de Tefé, CIMI/Regional Norte I, CPT , GRUCATE, INPA, SEMMA – Tefé, FUNAI e UEA/CEST), em um total de 99 pessoas, presentes no Seminário de Sustentabilidade Econômica e Meio Ambiente em Terras Indígenas do Médio Solimões e Afluentes, realizado de 02 a 05 de junho de 2006, na Aldeia Nova Esperança – Terra Indígena Barreira da Missão – Município de Tefé – Amazonas, organizado pela UNI – União das Nações Indígenas de Tefé, com apoio da Agenda Positiva da Região de Tefé (IBAMA, IDSM, FUNAI, GPD, GTA, CPT , SEMMA – Tefé, CIMI, INCRA e UEA/CEST) e aldeias indígenas do Médio Solimões e Afluentes, onde refletimos e discutimos o tema central: Sustentabilidade Econômica e Meio Ambiente em Terras Indígenas , com enfoque ao Uso Sustentável dos Recursos Naturais – Potencialidades e Possibilidades de Projetos Alternativos de Geração de Renda e Fiscalização, Vigilância e Monitoramento dos Recursos Naturais – Legislação Ambiental e Indigenista.

            Durante o Seminário foram apresentados o Diagnóstico Sócio – Econômico e Ambiental das Terras Indígenas e o Diagnóstico da Fiscalização, Vigilância e Monitoramento em Terras Indígenas , sendo que as terras indígenas do Médio Solimões e Afluentes ainda são ricas em madeira de lei, óleos vegetais, caça, peixes e com a homologação, algumas dessas riquezas aumentaram ainda mais, gerando um grande interesse de empresas e grupos que vivem da exploração da natureza. Esses, muitas vezes subordinam alguns indígenas em transações envolvendo os recursos naturais, obtendo vantagens lesivas aos indígenas, ou outras vezes, invadindo e depredando essas áreas.

A ausência de políticas públicas na região que afetam diretamente os povos indígenas, tem provocado ou estimulado situações em que os indígenas usam os recursos naturais de uma forma descontrolada, infringindo a legislação ambiental e indigenista vigente. Em outras situações vem aumentando os conflitos com os moradores não indígenas, especialmente os ribeirinhos.

Tais atitudes têm levado a uma situação de tensão entre esses atores, além do que tem colocado em risco a sobrevivência dos povos indígenas em suas próprias terras por causa do uso descontrolado dos recursos naturais, ao se verem sem opções e alternativas econômicas para suprir as suas necessidades básicas.

Isto vem gerando a necessidade das aldeias indígenas responderem de forma eficiente, a luz da lei e do que é possível, as necessidades surgidas pela invasão e exploração predatória, e em algumas já existe a autodefesa, mas é preciso uma formação que prepare os indígenas para agirem dentro da lei, sem excessos, sem violência e com dignidade.

            Há também uma presença da população não indígena dentro dos municípios que pressionam as terras indígenas, como também os governos federal, estadual e municipais que vem implementando projetos, como por exemplo, a abertura da Estrada Tefé – Emade, que corta a Terra Indígena Barreira da Missão, sem uma discussão ou acordo com os povos indígenas que lá vivem.

            Diante desse contexto, os representantes deste Seminário procuraram construir e elaborar proposições e reivindicações a curto, médio e longo prazo, a luz das temáticas, direcionadas para as próprias terras indígenas – aldeias, organizações indígenas, organizações da sociedade civil parceiras e principalmente para as instituições governamentais no âmbito federal, estadual e municipal.

            Assim sendo, na temática: Uso Sustentável dos Recursos Naturais reivindicamos o seguinte:

  1. Intensificar os projetos coletivos de geração de renda propostos e discutidos com e pelas aldeias indígenas levando em conta a cultura de cada povo.
  2. Priorizar a participação das aldeias indígenas na elaboração, execução e gerenciamento dos projetos de geração de renda.
  3. Explorar de forma sustentável os recursos naturais das terras indígenas, garantindo ou tendo cuidado com as espécies ou produtos explorados.
  4. Aprender sobre o que é manejo sustentável, aliando o conhecimento tradicional e científico.
  5. Recuperar, valorizar e divulgar os conhecimentos tradicionais (experiências) sobre o manejo sustentável presentes na memória da população indígena.
  6. Firmar acordos, convênios ou parcerias com os governos em âmbito federal, estadual e municipal e ONG´s para o acompanhamento e desenvolvimento técnico e tecnológico na agricultura de subsistência, manejos, mercados e preços, artesanato, habitação, saneamento,…
  7. Fazer esforços na construção de alianças, visando a alteração das leis ambientais e indigenistas do país, em prol do desenvolvimento sustentável das terras indígenas, possibilitando o manejo de pescado, madeira, caça, quelônios e o ecoturismo.
  8. Capacitar as lideranças de base para o gerenciamento e o fortalecimento da organização das aldeias indígenas, objetivando a execução de projetos sustentáveis.
  9. Ter as potencialidades econômicas das terras indígenas como referência na elaboração de projetos coletivos de geração de renda a médio e longo prazo (açaí, castanha, óleos, seringa, mel de abelha, artesanato,..).
  10. Abrir uma discussão nas aldeias indígenas sobre os benefícios financeiros do governo repassados de forma individual para reverter sua aplicação de forma coletiva, de acordo com a cultura de cada povo.
  11. Intensificar a Educação Ambiental nas aldeias indígenas.

           

Na temática: Fiscalização, Vigilância e Monitoramento dos Recursos Naturais reivindicamos o seguinte:

  1. Fazer palestras de sensibilização, oficinas e material informativo sobre legislação ambiental e indigenista no âmbito de região e aldeia indígena.
  2. Capacitar e credenciar AAV – Agente Ambiental Voluntário das terras indígenas do Médio Solimões e Afluentes junto ao IBAMA.
  3. Solicitar estudos de capacidade de suporte para verificar a necessidade de defeso do camarão.
  4. Continuar o fortalecimento da organização das aldeias indígenas para tomar atitude interna, buscar apoio externo e firmar parcerias.
  5. Elaborar projetos de fiscalização, vigilância e monitoramento da terra indígena para construir infra-estrutura (casa, flutuante, radiofonia, bote, materiais).
  6. Criar grupos de fiscalização, vigilância e monitoramento da terra indígena.
  7. Planejar as ações de fiscalização, vigilância e monitoramento da terra indígena com apoio da FUNAI, IBAMA, Polícia Federal e UNI.
  8. Denunciar as invasões e violências ocorridas na terra indígena para os órgãos competentes, principalmente o Ministério Público.
  9. Solicitar que a FUNAI agilize ou providencie a homologação das novas terras indígenas do Médio Solimões e Afluentes.
  10. Continuar as ações próprias de fiscalização, vigilância e monitoramento das terras indígenas,  protegendo os recursos naturais existentes, a luz das leis ambientais e indigenistas.
  11. Envolver as comunidades ribeirinhas da área de entorno da terra indígena para sensibilização através de encontros, reuniões e alianças.
  12. Manter limpas as variantes/picadas/limites e a manutenção das placas de identificação da terra indígena.
  13. Intensificar as relações sociais internas de diálogo e harmonia para a construção da independência financeira da aldeia indígena (autonomia).
  14. Fazer com que as ações de fiscalização, vigilância e monitoramento sejam contínuas no âmbito do órgão do Governo Federal responsável pela terra indígena (FUNAI).
  15. Aldeia Nova Esperança: Retomar as ações de fiscalização, vigilância e monitoramento e de outras atividades sociais e econômicas na área Chimuni, fazendo parcerias com as demais aldeias da Terra Indígena Barreira da Missão.
  16. Terra Indígena Barreira da Missão: Discutir de forma conjunta com as ONG’s e governos os impactos ambientais e sociais causados pela Estrada Tefé – Emade na Terra Indígena Barreira da Missão.

            A partir dessas reivindicações, estaremos discutindo das Terras Indígenas – aldeias aos governos um novo jeito de fazer sustentabilidade em terras indígenas, a luz da cultura de cada povo indígena da Região do Médio Solimões e Afluentes, a qual envolve as comunidades ribeirinhas e urbanas na luta por um outro modelo de sociedade, onde todos e todas possam ser atendidos/as por políticas públicas igualitárias, pois entendemos que “a sustentabilidade é um direito, mas tem que ser do nosso jeito”.

 

Tomé Fernandes Cruz

Coordenador Administrativo da UNI – Tefé

 

Carta do Seminário de Sustentabilidade Econômica e Meio Ambiente em Terras Indígenas do Médio Solimões e Afluentes

 

Fonte: arquivo pessoal do pesquisador Rafael Xucuru-Kariri

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