Aldeia Apiwtxa, Marechal Thaumaturgo, Acre, 19 de novembro de 2021
DECLARAÇÃO DO CONGRESSO INTERNACIONAL APIWTXA – AMEAÇAS, PROTEÇÃO E DESENVOLVIMENTO NA FRONTEIRA AMAZÔNICA
Os povos indígenas Asháninka, Ashéninka, Arara, Kuntanawa, Huni Kuin-Kashinawa,
Yaminahua e Amahuaca, representados pelas organizações OPIRJ, Apiwtxa, Instituto Yorenka Tasorentsi, AJRBI, Associação Arara do Rio Amônia, ACONADIYSH, ACCY, AACAPPY, AKARIB, AARIB, habitantes da fronteira entre Peru e Brasil, nas regiões do Yurúa e Alto Tamaya no Ucayali e Alto Juruá no Acre, que juntos protegem mais de 3 milhões de hectares, em uma das regiões mais preservadas e de maior biodiversidade da Amazônia, reunidos em uma assembleia de lideranças e autoridades, perante à situação ameaçadora que sofremos em ambos os lados da fronteira do Peru e do Brasil, declaramos o seguinte:
Nós, povos indígenas, reafirmamos que nunca fomos descobertos. Somos os donos ancestrais de nossas terras, que nos vem sendo roubadas e destruídas por invasores, empresas extrativistas e máfias de todos os tipos.
As ameaças que enfrentamos são enormes, mas o narcotráfico, as estradas ilegais, os madeireiros, a mineração ilegal e a grilagem de terra, todos protegidos pela corrupção do Estado, não param de destruir nossos territórios e florestas. Há anos eles assassinam nossos líderes, sem serem punidos por seus crimes e muitos de nossos líderes continuam sendo ameaçados por aqueles que querem se apropriar de nossas terras e nossos recursos naturais. Apesar de nossas denúncias e do conhecimento dos órgãos de Justiça do Estado, os culpados não estão sendo punidos.
Nós, povos indígenas, reiteramos nosso compromisso em prol de uma existência em harmonia e pacífica com a floresta e com todos que vivem em comunidades e cidades. Não queremos tirar nada deles, nem os tratamos como temos sido tratados há séculos. Nossos povos são nobres e não retribuímos os abusos e ofensas que vivenciamos há anos. No entanto, não aceitamos que a destruição da floresta também se transforme em nossa própria destruição.
Nós, indígenas, sabemos que é possível fazer de cada lugar o melhor lugar do mundo para se viver, por isso cuidamos de nossa floresta, do nosso lar e geramos ar puro, água limpa, biodiversidade, sabedoria e cultura para nossos países e para o mundo. Nossos povos acreditam na vida. Por isso, propomos aos nossos governos, nossos aliados, nossas autoridades em todos os níveis e à comunidade internacional, os seguintes pontos:
- Exigimos que as autoridades competentes do Brasil e do Peru cumpram com sua obrigação de proteger as fronteiras, os direitos dos povos indígenas e do meio ambiente. No Brasil, é necessária uma maior presença de autoridades do Estado e uma maior atuação em defesa de todos que habitam as fronteiras do país. No Peru, exigimos que o Estado monitore, sancione e atue sobre as autoridades locais e regionais, que violam constantemente os direitos da população indígena.
- Exigimos do Governo peruano ações imediatas pelas violações de direitos que a comunidade nativa Sawawo Hito 40 vem sofrendo ao longo da fronteira com o Brasil. Apesar das claras denúncias e evidências de invasões em seu território por madeireiros ilegais e grileiros de terra, o Poder Judiciário peruano mais uma vez favorece os invasores, os criminosos, ao invés de proteger seus cidadãos. Chamamos a atenção da comunidade internacional para as constantes violações dos direitos indígenas no Peru. Não aceitamos que os crimes contra povos indígenas continuem impunes no Peru, Brasil e outras partes do mundo.
- Exigimos respeito para fazer a gestão de nosso próprio desenvolvimento. Não queremos que nos seja imposto um modelo de desenvolvimento externo, que destrói florestas e é abusivo e cruel com as pessoas. Por isso, recorremos aos direitos reconhecidos pelas Nações Unidas e outras organizações nacionais e internacionais. É fundamental que os direitos à saúde, educação, ao território e à autodeterminação sejam respeitados. Exigimos que os governos estejam a serviço dos cidadãos e não das empresas e de outros interesses que afetam diretamente a autodeterminação de nós, povos indígenas.
- Rejeitamos veementemente que Estados e empresas tomem decisões sobre nossos territórios sem prévia consulta e consentimento prévio, livre e informado, garantidos por lei, bem como outros projetos de infraestrutura e extração mineral que nos afetam e põem em perigo a nossa existência, como é o caso da Rodovia
Masisea – Alto Tamaya e a Estrada Pucallpa – Cruzeiro do Sul.
- Não permitiremos o avanço de projetos ilegais como a Estrada Nueva Italia –
Sawawo – Puerto Breu e exigimos o fechamento dos acessos terrestres já abertos.
- No caso do distrito peruano Yurúa, exigimos do Governo Regional do Ucayali a
construção imediata do aeroporto de Puerto Breu, uma maior presença do Estado e a melhoria dos serviços públicos para a população.
- Exigimos do governo peruano que atenda às necessidades da comunidade nativa do Alto Tamaya Saweto, também na fronteira entre o Brasil e o Peru. Exigimos que o Poder Judiciário peruano finalmente condene os assassinos das lideranças comunitárias, cujo crime está impune há sete anos, e que sejam expulsos os madeireiros e invasores ilegais que continuam a ameaçar a vida da população de Saweto.
- Por fim, reafirmamos os laços de fraternidade entre os povoados fronteiriços das regiões Yurúa e Alto Tamaya no Ucayali e Alto Juruá no Acre, com os quais fortalecemos a aliança para proteger a vida dos povos indígenas, as florestas que são nossas terras e nossa fonte de sustento, além de ajudar a manter a estabilidade climática do planeta do qual todos dependemos. Nos comprometemos a trabalhar juntos, como irmãos e irmãs que somos, para juntos enfrentarmos as ameaças que sofremos sobre nossas vidas e nossos territórios.
Assinam este acordo em 19 de novembro de 2021 – Aldeia Apiwtxa, Marechal Thaumaturgo, Acre
Associação Ashaninka do Rio Amônia – Apiwtxa
Organização dos Povos Indígenas do Rio Juruá – OPIRJ
Organización Regional AIDESEP Ucayali – ORAU
Asociación de Comunidades Nativas para el Desarrollo Integral de Yurúa Yono Sharakoiai
– ACONADIYSH
Asociación de Conservación Comunal Yurúa – ACCY
Asociación Ambiental de la Comunidad Ashéninka Pocharipankoky Pikiyaco Yurúa – AACAPPY
Associação Ashaninka de Rio Breu – AARIB
Associação Jaminawa Arara do Rio Bagé – AJRBI
Associação Kaxinawá do Rio Breu – AKARIB
Associação Arara do Rio Amônia – ARARA
Fonte: https://cpiacre.org.br/congresso-internacional-apiwtxa-ameacas-protecao-e-desenvolvimento-na-fronteira-amazonica/
Original: 2021.11.19 Do Congresso Apiwtxa para Brasil e Peru