Pesqueira - PE, 04 de agosto de 2003.

Dos Xucuru para o Brasil.

Para:

Sr. Ministro de Estado da Justiça, A/C Gabinete do Ministro;

Sr. Presidente da Funai, Dr. Eduardo Almeida;

GT/Funai Portaria n.º 331/2003, A/C Sr. Benedito Rangel;

Sr. Ministro da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência
da República, Dr. Nilmário Miranda;

Comissão Especial – Resolução n.º 18/03 / SEDH, A/C Dr. Luciano Mariz
Maia

Sr. Procurador Geral da República, Dr. Cláudio Lemos Fonteles;

Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, A/C Drº. Maria Eliane
Menezes;

6ª. Câmara de Coordenação e Revisão do MPF, A/C Drª Ela Wiecko;

Procuradoria da República no Estado de Pernambuco, A/C Dr. Marcos Costa;

Ao MM. Juiz da 4.ª Vara Federal, Dr. Antônio Bruno de Azevedo Moreira;

Ao Desembargador Presidente do Tribunal Regional Federal da 5.ª Região;

Sindicato dos Servidores Públicos Federais no Estado de Pernambuco, A/C

Sr. José Carlos de Oliveira;

Deputado Federal e Presidente da Comissão de Constituição, Justiça e
Redação da Câmara Federal, Dr. Luiz Eduardo Greenhalgh;

Deputado Federal Fernando Ferro

Deputada Federal Irini Lopes;

Deputado Estadual Roberto Leandro, presidente da Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da Assembléia Legislativa do Estado de Pernambuco;

Deputado Estadual Isaltino Nascimento;

Secretariado Nacional do Conselho Indigenista Missionário – Cimi;

Coordenação do Centro de Cultura Luiz Freire – CCLF;

Coordenação do Centro Dom Hélder Câmara – CENDHEC;

Coordenação do Movimento Tortura Nunca Mais;

Coordenação da Articulação dos Povos Indígenas do NE, MG e ES – APOINME;

Anaí – PE;

Anaí – BA;

Jornal do Commércio;

Diário de Pernambuco;

Folha de Pernambuco;

Rede Globo Nordeste – NE/TV;

Aos Povos Indígenas de Pernambuco;

Ao Público em geral.

 

Senhoras e Senhores.

 

Nós, lideranças tradicionais do Povo Indígena Xukuru, a respeito dos
incidentes ocorridos na sede da Funai no Recife, na terça-feira 29 de
julho, noticiados na imprensa conforme cópias anexas, gostaríamos de
transmitir algumas informações e a nossa posição a respeito do assunto.

Tomamos conhecimento dos fatos no dia seguinte, através das matérias publicadas pela imprensa. São fatos realmente graves e lamentáveis, mas que não nos deixam surpresos.

Nós, lideranças, bem como o Povo Xukuru em geral, há tempos temos
evitado nos deslocar até a sede da Funai no Recife. Primeiramente,
porque tratamos as questões ligadas a nossos direitos e interesses de
forma coletiva, no conjunto das lideranças das aldeias do Povo Xukuru, e
entendemos que o melhor local para discutir e encaminhar tais questões,
inclusive com as autoridades do poder público, em reuniões dentro de
nosso próprio território, sempre que possível.

Em segundo, temos evitado a sede da Funai no Recife porque esta passou a ser, de uns meses para cá, local de grande insegurança, em razão da presença constante de um grupo de indígenas inescrupulosos e perigosos, dispostos a tudo, inclusive a violência, para atingirem seus objetivos pessoais. São verdadeiros parasitas, que buscam viver nas proximidades de órgãos públicos na tentativa de obter para si vantagens às quais as suas comunidades não têm acesso.

Particularmente para nós, lideranças do Povo Xukuru, é grande a
insegurança diante da presença desse tipo de pessoas que parasitam e
perturbam a sede da Funai. O nosso trabalho, voltado para a satisfação
das necessidades coletivas de nosso povo, de acordo com nossa
organização social e nossos costumes, desagrada profundamente essas
pessoas. Por isso nos hostilizam e perseguem de forma sistemática, com
calúnias, injúrias, difamações e até mesmo ameaças e agressões físicas.

Não temos conhecimento dos detalhes dos incidentes ocorridos na Funai no dia 29 de julho, nem dos nomes dos envolvidos nos atos de agressão aos servidores do órgão, a não ser do único que chegou a ser divulgado pela imprensa: o Xukuru ADEMIR PARNAÍBA, que teria, segundo as matérias, tentado acorrentar o Sr. BENEDITO RANGEL.

Na verdade este comportamento atribuído ao Sr. ADEMIR PARNAÍBA, também conhecido como “DEMA”, em nada nos surpreende. Este senhor pertence ao mesmo grupo formado por EXPEDITO ALVES CABRAL (“BIÚ”), GENIVALDO FEITOZA (“CANÁRIO”), ANTÔNIO ROSA DE LIMA e JOSÉ LINDOMAR DE SANTANA (“VÉIO”), que por não aceitarem a nossa prática, de ter como critério maior o interesse coletivo nos encaminhamentos dos assuntos de interesse de nosso Povo, tornaram-se opositores das lideranças tradicionais Xukuru. Primeiro, tentando em vão nos extorquir a fim de obterem vantagens pessoais, tal como parece ter tentado o Sr. ADEMIR PARNAÍBA em relação aos servidores da Funai. Depois, perseguindo-nos, tentando nos desmoralizar junto a órgãos públicos com calúnias e difamaçõe. Sabe Deus a troco de quê.

A partir de suas calúnias e difamações o Sr. ADEMIR PARNAÍBA (como também outros acima citados), foi escolhido pelo Ministério Público Federal como uma das testemunhas de Acusação contra o nosso Vice-Cacique ZÉ DE SANTA e contra o índio DANDÃO, injustamente apontados como responsáveis pelo assassinato do líder CHICO QUELÉ. Entre os vários
falsos testemunhos que deu no caso CHICO QUELÉ, o Sr. ADEMIR PARNAÍBA disse, por exemplo, que o índio DANDÃO havia vendido sua casa e fugido da cidade de Pesqueira rapidamente. Sempre esteve comprovado que essa informação, transmitida por ADEMIR PARNAÍBA, era completamente falsa. Contudo, essa informação falsa, entre outras, contribuiu para que o Juiz Federal da 4.ª Vara mantivesse DANDÃO recolhido um ano inteiro no Presídio Aníbal Bruno, no Recife, de lá só saindo agora, no dia 02 de julho, por ordem do Supremo Tribunal Federal, em Brasília.

É gente do tipo do Sr. ADEMIR PARNAÍBA que forma o rol de testemunhas de acusação contra DANDÃO e ZÉ DE SANTA no caso CHICO QUELÉ

Infelizmente é a esse tipo de gente que o Ministério Público Federal em Pernambuco dá crédito e atenção preferencial, para depois chegar à
conclusão absurda de que reina um clima de terror interno no seio da
comunidade Xukuru, e que isso seria culpa das lideranças tradicionais,
taxadas de violentas e corruptas – sempre conforme as calúnias e
difamações de gente como o Sr. ADEMIR PARNAÍBA.

Esse lamentável episódio ocorrido na Funai vem apenas dar uma pequena demonstração daquilo que dizemos tantas vezes e que os Procuradores da República em Pernambuco parecem preferir não acreditar: que as acusações feitas contra as lideranças tradicionais do Povo Xukuru são movidas por interesses pessoais e certamente devem ter, por trás, a mão de pessoas inconformadas com a demarcação de nossas terras e o crescimento do processo de autonomia de nossa comunidade.

Queremos externar aqui a nossa solidariedade para com os servidores da Funai, agredidos e humilhados, não só neste episódio do dia 29 de julho,
mas também em outros que soubemos terem acontecido na mesma sede do
órgão no Recife, porém sem repercussão na imprensa.

Apoiamos completamente a iniciativa destes servidores em levarem o caso à Polícia Federal a fim de se apurar os fatos e se responsabilizar os
culpados, para que não haja, mais uma vez, o predomínio da impunidade.

Esperamos que tais servidores façam o mais rápido possível a divulgação dos nomes dos demais agressores e das etnias às quais pertencem, pois o fato destas informações não terem sido divulgadas vem em prejuízo da imagem das comunidades indígenas em Pernambuco, pois tende a fazer com que a opinião pública veja os responsáveis pelo incidente de forma generalizada, como sendo “os Xukuru” indistintamente, ou “os Pankararu”, indistintamente.

Por fim, esperamos que esse episódio lamentável sirva como alerta ao
Presidente LULA, ao Ministro Márcio Tomaz Bastos e ao Presidente da
Funai, para que a situação do órgão seja posta a limpo imediatamente,
para que os Povos Indígenas possam, enfim, poder passar a contar com a
Funai como um espaço democrático, transparente e a serviço das reais
necessidades dos Povos e Comunidades Indígenas.

 

Fonte: Arquivo pessoal do pesquisador Rafael Xucuru-Kariri.

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